28.12.06

Caramujo

Por André Coruja
dO Meio do Mundo

Perdi meus dentes num sorriso vão
por acreditar em ti
Não quero mais sair
da cerca que faço
o varal que me veste em casa
Mande lá, mãe-de-aluguel,
longe daqui,
porque eu não me perco mais
morando em mim

25.12.06

A personalidade e a parede

Por Leandro Bender
da Oca


Eu comparo a personalidade a uma parede. Primeiro, começa com uma idéia, depois é construída com muito cimento, tijolo encima de tijolo, cuidadosamente colocado para que não fique torto e tombe com qualquer empurrão.

Depois de erguida a parede espera-se secar e põe-se argamassa, deixa-se a superfície lisinha, sem nenhum defeito a olho nu. Tem quem prefira deixar com aquela superfície áspera que machuca quando nos encostamos nela, mas isso aí vem de cada um.

Depois de tudo pronto e bem feito é hora de escolher a cor: preto pra dar um ar de abafado, branco pra quem não quer arriscar a sair do tradicional, verde musgo pra quem quer um tom de nostalgia no lugar, laranja acrílico pra quem tem motivos pra ser feliz... Enfim, após escolhida, vem a pintura e lá esta a parede pronta, belíssima, inatingível e agora irá nos proteger de intrusos, ladrões, olhares não bem vindos.

Agora sim estamos seguros, temos a proteção da parede, mas basta uma martela um pouco mais forte que ela facilmente vem abaixo como um castelinho de areia (depende do material da parede). Tanto trabalho, tanto suor, tudo destruído com uma martelada e um pouco de força...

Tenho que arrumar mais tijolos. Alguém tem algum pra me dar?

23.12.06

Homens são todos iguais — dizem as mulheres. Calma! Valho-me do discurso não para gerar discussão. Longe de mim! Não quero questionar dogmas tão internalizados nas concepções femininas (talvez até predisposição genética). Venho, aqui, concordar com um preceito básico e assumir minha condição masculina, naturalmente machista.

Sei que parece que estou tentando ser o novo Chico Buarque com esses papos de quem entende e concorda com as mulheres. Pensando bem, não vai adiantar. Vou arrumar briga. Pois muito bem, preparem-se para ler mais um clichê de quem mija de pé: eu dirijo bem. Muito bem, por sinal.

Falo isso sem pudor, mesmo, e daí? As principais referências automotivas que tenho, depois de Ayrton Senna, são meus pais, claro. Desde criancinha, com meu velocípede, fui desenvolvendo um senso de direção bem arguto. Projetava mentalmente várias manobras como passar por baixo das pernas de adultos ou descer pequenos lances de escadas com minha “motoquinha”.

Que as autoridades não leiam (e, se lerem, não há denúncia. Ah! Quem se importa?), mas meu pai começou a me dar a direção do carro quando eu tinha uns 7, 8 anos. Quando finalmente alcancei, por baixo, o final dos pedais e, por cima, visibilidade boa do que havia a minha frente, aos 10, 11 anos, comecei a dirigir sozinho. Morava em Macapá, nos idos de 1995. Viajávamos todo fim-de-semana para o Aporema, município de Tartarugalzinho, a mais de 200 km da capital — permitam-me o momento de nostalgia — e eu já ia dirigindo boa parte do trajeto. Mamãe só não deixava onde sabia que havia polícia rodoviária e nos trechos não-asfaltados.
Pensando bem, agora, eu não dirigia quase nada do trajeto inteiro. Ah, mamãe me ludibriou. Enfim, deixa pra lá! Na época, aquilo já era o máximo pra mim.

Passados alguns anos desenvolvendo aquela percepção que só saca mesmo quem dirige e que não ensinam na auto-escola, tornei-me um tanto pródigo em minhas ações ao volante. E não estou falando de manobras radicais, cavalos-de-pau ou rachas. Apenas percepções de trânsito e de condução veicular que me ajudam cada vez mais a não entrar em certas enrascadas ou aproveitar do carro aquilo que ele pode oferecer. Neste tempo, eu cresci. Costumo dizer a mamãe, o que não é surpreendente, que ela está encolhendo à medida que nós crescemos. Bobagem, claro. Brincadeirinha com ela. Mas qual não é a minha gabolice ao ouvir dela mesma, filha e irmã de motoristas, que eu sou quem dirige melhor na família. Melhor que isso? Até vovô diz.

Sei que este texto parece carta de auto-promoção pra conseguir emprego em algum blindado de político com ar-condicionado e trajetos curtos de centro de cidade. Mas não é. Trata-se de uma análise pseudo-complexa acerca das relações humanas. Afirmo tais falas com o seguinte relato:

Nesta noite de 22 de dezembro, sexta-feira, minha irmã apresentou um auto de natal com várias outras pessoas. Nossos pais e eu fomos assisti-la como família orgulhosa que somos. Eu estava cansado e pulei logo para o banco de trás, na ida. Meu pai pegou a chave e mostrou possíveis pontos em que a marcha não deveria ter entrado. Ele é bom nisso. Nunca entra no tempo do motor. Fora o hábito que entristece o carro e do qual ele se vangloria por parecer um macete, de passar da terceira para a quinta. Ah! Pra provar que era ruim até o fim ele precisava estacionar mal. E não é que me surpreendeu com tamanha habilidade para não conseguir entrar numa vaga?

Para quem pensa que somos uma família legal que não dá palpites na direção alheia, engana-se. Estes minutos engraçados foram recheados de reclamações de minha mãe. Ao chegarmos, ele foi peremptório: “Não dirijo mais!”.

Assistimos o auto de natal. Foi muito bonito. Maninha e colegas fizeram um trabalho primoroso, de belíssimo gosto. Um roteiro muito divertido que não vou contar aqui. Por que não foram assistir?

Ao voltarmos, mamãe assumiu as chaves, disparou o alarme que destranca as portas e entrou toda boçal enquanto meu pai perguntava por mim (suponho que intuía que eu dirigisse). Achei ótimo. Não queria dirigir mesmo.

Mamãe provou, no caminho de volta, o quanto desaprendeu desde que eu a assistia dirigir, ainda pequeno. Agora penso no fato de que, àquela época, eu não enxergava nada que não fosse o próprio carro e o céu. E o balançar dos carros é como um balanço de berços para os pequenos, não é verdade? O ruído da aceleração é como musiquinha de ninar.

Naturalmente, como todo casamento longevo (o que é bom!), um tira sarro do outro. E meu pai não perdeu a oportunidade de salientar todas as barbeiragens de mamãe. As mais engraçadas foram parar sobre a ciclofaixa, dobrar na parte errada do retorno e seguir em frente, na rua de casa, pela esquerda. Em via de mão-dupla, pensava eu que ela se contagiava por alguma influência britânica. Coisas de “lady” que já não quer mais dirigir. Enfim, chegar em casa foi um alívio.

E agora, com as férias de fim de ano da Universidade, Maninha freqüenta a auto-escola, faz os exames do DETRAN, ou seja, está tirando a sua habilitação. Torço para que ela não sofra a influência genética ou adquira, hereditariamente, os comportamentos relacionados à maneira de agir de nossos pais com seus sensos de direção e de compreensão do rendimento do motor. Pela lógica, não haverá surpresa se tivermos que desembolsar quilos de taxas do exame de trânsito. Mas acredito nela. Espero que tudo aconteça normalmente e tenhamos uma exímia motorista na família.

Precisamos desta nova motorista. Quantas madrugadas eu já não tive que irromper, incomodando o silêncio habitual, para buscá-la em festas, em casas de amigas, solenidades, enfim, um sem-número de situações que também vivencio e que não dão o mínimo de vontade de voltar pra casa dirigindo — não! Antes que pensem, eu não bebo —. Logo, logo, poderei pedir a ela que o faço por mim. Ah! Como eu espero...

Se é pela preguiça? Antes fosse. Meu medo mesmo é que ela dirija mal. Se assim for, terei todos os motivos pra crer no que mais temo, no mais óbvio: sou adotado.

20.12.06

Eco à Dor

Um grito de dor
na floresta ecoa
até se perder em várzeas
em vozes vazias
de visagens que se vão
Quem ouviu?

Debaixo das folhas desse telhado,
a casa é nossa.

De uma ponta a outra
a gente pode apontar pro futuro
Sim! Atirar no escuro
sem temer
ou disfarçar
porque o eco leva o som pra longe
pra longe, pra bem longe...

E, se um grito de dor ecoar,
vai ser tão depois
que, na hora em que a ajuda chegar,
a dor já se foi.

Equação

Na guerra fria, uma linha divisória espacial que tornou-se até divisão de tempos, de eras, chamava-se Muro de Berlim. A simbólica Cortina de Ferro que se estendia na divisão entre Leste e Oeste.

O que é o Equador, hoje, quando vemos a divisão Norte e Sul? Seria mais uma linha divisória?

Pensando bem, acho que não. Não há um muro. Há, sim, uma linha imaginária. E a linha também faz parte da área.

O mundo não tem duas meias-luas. Não existe uma cisão representada claramente por uma construção do homem, com o intuito de separar. Equador é o ponto de convergência, a intersecção entre estas regiões que se mostram tão distintas, tão distantes, às vezes. Todos pleiteiam o meio do mundo.

A gente que é daqui, que joga no meio-campo, ora defende, ora ataca... precisa ser e é versátil. O bairrismo típico não é mole como argila, não quebra como barro. É orgulho do chão. É barroco, dicotômico. A fórmula da curandeira é desejada pela high-tech, o canto ritual dos índios é world music, há um pólo industrial manauara, há um pó que vai pra todo o mundo.

Nem todos sabem de nós. Muitos se fecham em seus pequenos mundos. A gente, pra não ser só exótico, tem que se inteirar de tudo. E eu sei o que está rolando por aí. Mas também sei muito de cá. Local e global. Não só eu. Aqui a gente tem que ser assim pra ter voz, pra se fazer entender lá onde nossas notícias não chegam. E a gente só sabe o que acontece por aí, em todo lugar, porque somos iguais. Eco! Equatoriais, eqüidistantes dos trópicos, dos pólos. Somos da linha que faz parte de ambas as partes.

Amargue-nos! Somos do âmago do mundo.

12.12.06

Temporais nas beiras do mundo

Reitero a minha opinião de que os temporais são mesmo do céu. Calma! A redundância se justifica: à medida que as chuvas são mais fortes, as especificidades do lugar vão-se dirimindo. Parece que a terra das chuvas é uma só. E quanto mais interna a análise, mais fortaleço a colocação.
Tudo bem. Vou-me explicar melhor.
A maioria da população mundial vive em áreas não saneadas — não tenho dados estatísticos que comprovem esta informação, mas já cansei de ler e ouvir em veículos de comunicação tal informe que o tenho como dogma. E os que vivem em áreas com devido esgotamento, galerias subterrâneas e canais prontos a dar vazão às precipitações pluviais, quando vitimados por temporais, não diferem tanto dos que só tem a terra pra sugar a água. Bueiros entopem, canais transbordam. Tudo alaga, enfim. Quem é esperto fica em casa, tira tudo da tomada, sai de perto de objetos eletrônicos, e espera. Quem está na rua, nos carros, tende a procurar locais seguros para abrigar-se. É aí que a magia reversa ocorre: a densidade da tormenta é tão avassaladora que as paisagens vão desaparecendo. No Rio de Janeiro, ninguém vê o Corcovado; Em Paris, a Torre Eiffel parece que foi desmontada; o que dizer dos imponentes edifícios nos países emergentes do sul asiático e Oriente Médio? Será que eram montagens dos cartões postais?
Pois bem, por enquanto, tudo é visto pelos olhos do ser humano. E em qualquer lugar, a acuidade visual considerada normal pelo senso comum não enxerga mais nada a poucos metros. Justo nestes momentos em que deixamos de ver o que há em volta, em que buscamos paciência para a espera, em que as maravilhas da tecnologia moderna devem ser desligadas, o passatempo mais natural é deixar que estes olhos acostumados ao mundo exterior se desconectem da função. Esta é uma hora em que o camponês de Bangladesh ou o executivo de Manhattan se parecem um pouco mais. Sitiados, muitas vezes eles só têm a si. Hora de olhar pra dentro.
Eu me vi nesta situação há poucas horas. Optei por ler enquanto ainda podia utilizar um pouco da luz natural. Mas antes das 17 horas já não era mais possível fazê-lo sem forçar a visão. Ao acender uma lâmpada para ler o capítulo seguinte, entrei na parte da trama em que o personagem principal de O Jogador, de Dostoievski (escritor russo; 1821-1881) entra em seu quarto ao cair da noite, decidido a não voltar mais ao cassino e encontra a mulher que ama sentada em seu divã, à sua espera. Eis um dos grandes momentos do romance. Parte elucidativa. Elucidativa, sim, mas... e a luz? Claro! Há de se ter uma luz acesa. O que seria do romance sem as representações simbólicas de luzes, velas, chama, sombras?
Dei-me conta, neste momento, tomado pelo envolvimento quase imantado que o livro me punha, quase escutando os dizeres daquele quarto de hotel alemão de meados do século XIX, que eu estava num momento mais do que propício a viver algo assim. Sim, eu precisava apagar imediatamente a luz. Não pestanejei. Acendi o primeiro toco de vela que encontrei e ele passou a ser a iluminação de minha sala (ninguém disse que a vela precisava ser bonita). Deixei o livro pra depois. Era a hora de viver a época. Era hora de voltar aos primórdios, aos primórdios do meu próprio ser. O barulho era rajada de chuva e vento e a luz era vinda da chama.
Quanto mais interno o momento, mais parecido com lugares e tempos. Mais embrionário.
Li a mim.

Ah, temporal...

Em Belém, não é surpresa chover. Ainda mais à tarde. Todo mundo está vacinado para as atividades antes e depois da chuva. Mas um temporal como o desta segunda-feira (11/12) surpreende a todos. Não é aquela nossa chuva sagrada que ameniza o calor e mote turístico, bradado a todos que não vivem aqui.
Muitas vezes já me deparei com pessoas de outras cidades (inclusive nas outras cidades) perguntando se era verdade que em Belém chovia toda tarde. Eu nem tento polemizar muito, pra não parecer discurso panfletário de agência de turismo: “Fim de ano em Belém com chuvas de água e de mangas a preço promocional”.
O trânsito já caótico de uma cidade sem muitas alternativas viárias, resultado de um povoamento que, de forma alguma, previu o crescimento urbano desenfreado ocorrido desde os tempos ditos áureos da borracha. Belém é limitada a norte, oeste e sul por rios e pela Baía do Guajará. Ilhada seria se não fosse o município de Ananindeua, o único limítrofe à capital por vias terrestres.
Com uma tradição portuária de séculos, a economia da cidade ainda tem nos meios fluviais um forte pilar de sustentação. Pesca, comércio, indústria naval, transportes, turismo (...) são alguns exemplos de atividades ligadas ao devido aproveitamento do que é natural de cá.
Belém é, ainda, em seu subsolo, rica em mananciais. Os perfuradores de poços nem chegam a ter muito trabalho quanto em outras regiões de solo mais árido. É... a água que cerca a cidade também está por baixo do chão em que pisamos. Chão este devidamente acostumado a absorver as já recorrentes águas pluviais. Conclusão: Belém só não afunda porque flutua em seus lençóis freáticos. Se não fosse Ananindeua a nos segurar, estaríamos à deriva.

9.11.06

A partir de agora...

9.10.06

Início

Hoje começa a estória por aqui.
Até então, uso o www.spaces.msn.com/omeiodomundo e vou mudar aos poucos.
(só eu vou ler isso)
hohohoho!